r i t m u n d a n o
m u n d a n o
mapartituras
Apesar de a música ser uma forma de arte eminentemente temporal, muitos de seus elementos compositivos são pensados como "objetos": notas, acordes, claves etc, e podem ser individualizados como símbolos visuais ou coordenadas alfanuméricas. Esses "objetos" musicais podem ser dispostos num plano, em trajetos a serem percorridos ou delimitando áreas num espaço codificado, como num mapa, sem um sentido temporal pré-definido. Embora muitos artistas (incluindo músicos, mas não só), desde o século 20, tenham experimentado disposições livres dos elementos musicais na página, a ideia de "mapas musicais" (no sentido de adaptar dispositivos cartográficos para escrever música) é algo pouco convencional, principalmente entre musicistas.
Abaixo alguns exemplos de aplicação dessa síntese entre partituras e mapas as "mapartituras".
Partitura-cortejo para Santo Amaro da Purificação
A cidade de Santo Amaro da Purificação, no Recôncavo baiano, é reconhecida como terra natal de diversos artistas importantes, incluindo Caetano Veloso, Maria Bethânia, Xisto Bahia e Emanuel Araújo, entre outros. Como outras cidades do Recôncavo (e de outras regiões do Brasil), Santo Amaro tem também uma tradição forte de bandas filarmônicas, grupos instrumentais de sopro e percussão. É também em Santo Amaro onde está localizado o Centro de Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas, da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (CECULT-UFRB), onde dou aula nos cursos de música e artes e no bacharelado interdisciplinar em cultura.
O traçado das ruas principais do centro de Santo Amaro segue o curso do rio Subaé, celebrizado em poesias e canções, como "Onde eu nasci passa um rio" e "Purificar o Subaé", de Caetano Veloso. A cidade sofre, desde há algumas décadas, com problemas sócio-ambientais, como a contaminação por chumbo provocada por uma empresa mineradora estrangeira nos anos 1980, e a poluição do rio.
A partitura-cortejo elaborada sobre o mapa da cidade é uma proposta de tradução do traçado das ruas em linhas melódicas a serem tocadas num cortejo por quatro grupos simultâneos de músicos de sopro e percussão. Cada melodia (a, b, c, d, na legenda) é tocada por um grupo, seguindo o trajeto determinado no mapa. Cada grupo que chegue a um encontro transversal ou convergência entre ruas ("acordes" na legenda), deve esperar a passagem do outro grupo da rua paralela e tocar um ciclo junto, promovendo uma polifonia temporária. Em alguns casos (como no início do cortejo) ocorre o encontro dos quatro grupos simultaneamente.